sábado, 12 de novembro de 2011

Diário do Nordeste
Publicado em 12 de novembro de 2011 
Acidentes com motos fazem 896% mais ví­timas em 10 anos.
Cada vítima deste tipo de acidente custa em média para o IJF exatos R$ 8 mil. Já na UTI, sobe para R$ 36 mil.

O baixo custo e a facilidade de crédito para aquisição fazem da motocicleta o meio de transporte que mais cresceu nos últimos anos. Porém, pessoas não habilitadas e sem conhecimento da legislação de trânsito vem adquirindo este meio de transporte, o que contribui para um aumento drástico nas mortes nas vias.

A ingestão de álcool
por estes condutores e a ausência de fiscalização também são fortes contribuintes para o aumento desta violência. Pelo menos é o que afirma o diretor executivo do Instituto Doutor José Frota (IJF), Casemiro Dutra. Ele informou que no hospital os acidentes de moto tiveram um aumento de 896% em uma década.

Em 2000, os mesmos somavam-se 670, já em 2010 este quantitativo vai para 6.300. E isso quando se contabiliza apenas os condutores da moto. Houve um momento em que a demanda estava tão alta, que o IJF decidiu colocar os demais atores envolvidos neste tipo de acidente, como os passageiros, em outras categorias de acidente de trânsito.

O pior é que o tratamento de cada paciente de acidente de moto, sem ter que ir para Unidade de Terapia Intensiva (UTI), custa exatos R$ 8 mil. Já os que necessitam ir para a unidade o custo salta para R$ 36 mil.

"Se consideramos que os 6.300 pacientes de 2010 custaram apenas R$ 8 mil, mesmo assim o valor desembolsado com estes chegaria a R$ 5 mi. O que poderia ser investido em prevenção", disse Dutra.

Já os dados do Departamento Estadual de Trânsito (Detran-CE) comprovam a falta de fiscalização existente no Ceará. De acordo com o órgão, até junho a frota de motocicletas do Estado correspondia a exatas 794.697 motos. Porém, o número de condutores habilitados não condiz com quantitativo que trafega nas vias, pois existem apenas 143.232 habilitados no Ceará.

O crescimento desta frota também disparou nos últimos anos, se em 2001 tínhamos o equivalente a 192.557 motos, hoje elas já somam 794.697. Ou seja, houve uma variação de 321,7%.

A quantidade de motociclistas mortos em acidentes de trânsito de janeiro a agosto deste ano corresponde a 502 pessoas. Dentro do universo de 1.320 óbitos, estes motociclistas representam 38% do geral. De acordo com os dados do Detran-CE, de 2002 até junho de 2011 foram morreram 3.847 motociclistas envolvidos nestes acidentes.

Para a doutora e professora do Departamento de Engenharia de Trânsito da Universidade Federal do Ceará (UFC), Maria Elizabeth Pinheiro Moreira, todas essas mortes, assim como o elevado número de motociclistas acidentados que dão entrada no IJF são o reflexo da ausência de fiscalização e educação no trânsito.

"Não sei como o Estado, diante desta carência de fiscais para todo o Ceará, ainda promove a Carteira Popular de Habilitação para motociclistas, que é gratuita", indagou Elizabeth.

O programa Carteira Nacional de Habilitação Popular é um programa do gestão estadual, e foi instituída em 2009. Até hoje, já foram entregues 10 mil habilitações do tipo A, para condutores de motos.

O Detran-CE possui 350 agentes de fiscalização para todos o estado e 11 postos espalhados e pela região. Segundo o órgão, as blitze são feitas em parceria com a PM.


THAYS LAVOR
REPÓRTER

A opinião do especialista

Alegrias efêmeras
Não é de hoje que se conhece os prazeres e delícias do uso da motocicleta. Vento no rosto, sensação de liberdade, facilidade de serpentear os engarrafamentos, rapidez e economia. Quem não se sente atraído por esse universo? No Brasil, o aumento da frota de motos em 2010 foi de 12%. No Ceará, 70,8% da frota é de motocicletas e 13,2% de automóveis. Na Capital, a frota de motos já é de 35%. Pelas ruas das cidades, nos outdoors, TV e outras mídias, somos bombardeados pela mensagem de que a moto é a solução mais prática e barata ao problema de trânsito. As revendedoras comemoram o crescimento das vendas, os índices de crescimento econômico acompanham essa linha para o alto e o Brasil parece crescer a olhos vistos, certo? Nem tanto. Segundo dados do Ministério da Saúde, aumenta a cada ano o numero de motociclistas mortos nos "acidentes" de trânsito. Quem de fato ganha com essa aceleração das vendas? Quem lucra com isso? A população certamente não, à medida em que pessoas estão morrendo. O Estado muito menos, uma vez que os custos com os acidentes de trânsito no Brasil é da ordem de bilhões de reais por ano. O desafio posto mundialmente é que haja uma redução pela metade desses dados alarmantes. É preciso um plano de mobilidade para as cidades. A toda hora, anuncia-se que soluções estão sendo desenvolvidas para o nosso trânsito. Pelo que vejo, elas privilegiam abertura de vias para serem ocupadas por mais veículos. Carecemos de um plano participativo de mobilidade humana. Precisamos de políticas públicas que privilegiem outros modos de deslocamento e que tenhamos coragem de romper com os ditames mercadológicos e possamos priorizar a vida humana. A alegria efêmera da motocicleta é mais uma ilusão de consumo num mundo onde é preciso sobreviver e não viver.

Gislene Maia de Macêdo, psicóloga e pesquisadora em Mobilidade Humana

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